Notas sobre a vida


Esse ano tem sido muito conturbado e eu resolvi tirar um tempo para refletir sobre alguns aspectos da minha vida, enquanto o tempo vai passando e vou trabalhando, estudando, vivendo e sobrevivendo. Os dias, por ora, parecem passar rápido demais e, ao mesmo tempo, se arrastam.

Ano passado foi muito difícil em termos de mudanças e, olhando para trás, hoje, não sei se tive tempo para me curar. Tive inúmeras crises de ansiedade, episódios de síndrome do pânico e um burnout para coroar o todo.

Coloquei na minha cabeça que 2024 seria diferente, que levaria as coisas de uma forma mais leve e diminuiria o ritmo. Bom, ao menos hoje posso dizer que até certo ponto eu tentei fazer isso, mesmo não acreditando muito que daria certo. Acabou que, nisso, eu estava certa.

O ano foi passando, a vida foi seguindo, os eventos foram acontecendo e, subitamente, tudo se tornou demais para suportar. Vinha me sentindo triste há um tempo, me isolando, cortando contatos, deixando de sair e de conversar com as pessoas e, para ser sincera, não sei dizer bem o porquê. Sei que na ocasião era o que fazia sentido para mim. O ponto é que eu estava cada vez mais ausente de tudo, mas principalmente de mim. 

Há uns dois meses, mais ou menos, tive uma crise depressiva bastante severa, algo que nunca experienciei nesses meus 29 anos de existência. O que eu achava ser um sintoma de TPM terminou comigo passando um dia inteiro na cama, aos prantos, sem conseguir me levantar nem para comer. Foi ali que me acendeu um alerta máximo.

É horrível dizer isso, mas sou muito resistente quanto ao uso de medicação. Sempre achei que os remédios me limitariam ou proibiriam de fazer as coisas que eu achava que queria fazer, então sempre busquei tudo quanto foi alternativa para não precisar voltar a tomar remédios (já tinha ido ao psiquiatra 3 vezes no período de 5 anos, o que não parece muito, mas para mim era um absurdo). Na minha cabeça, se não funcionou antes, não teria porque funcionar agora.

Acabou que eu estava me sentindo tão mal que meu primeiro pensamento foi pegar o telefone e agendar uma consulta psiquiátrica, o que até acho que foi bem corajoso da minha parte, considerando minha opinião sobre remédios. Até o dia da famigerada consulta, foram inúmeros episódios depressivos. Acho que nunca chorei tanto quanto esse ano, sem saber o motivo exato (nem acho que sou muito de chorar, na verdade, então realmente a situação estava bem esquisita).

A pior parte foi que passei por tudo isso em silêncio, me esforçando ao máximo para disfarçar tudo o que estava sentindo. A única coisa que eu dizia era que estava desanimada ou cansada, mas que logo passaria. Agora eu até ri sem humor, porque lembro de me achar sozinha o tempo todo, mas como não me sentir assim sendo que fiquei quieta sobre tudo?

Daí, foi uma coisa atrás da outra. Voltei a fazer terapia, li A Sociedade do Cansaço (em algum momento terei que falar sobre como esse livro é verdadeiramente transformador), fui para o psiquiatra e também comecei a frequentar um centro espírita. Tudo o que vi e ouvi nessas ocasiões me fez pensar muito e acredito que nessas últimas semanas o que eu mais tenha feito seja pensar.

Foi muito significativo da minha parte procurar ajuda, mas também começar a identificar os problemas que eu mesma vinha me causando, como disse anteriormente. Me sentia sozinha, mas não falava com ninguém. Reclamava que as coisas estavam difíceis, mas me acostumei com elas assim. Via as injustiças que aconteciam, mas aceitava-as quieta. 

Não dá para dizer que mudei e que não faço mais nada disso, até porque eu estaria mentindo, mas consegui identificar esses e outros padrões negativos no meu comportamento. Então ultimamente venho refletindo e pensando em como desconstruir todas essas formas de pensar e agir. 

Dizem que quando entramos no nosso “retorno de Saturno”, a concreticidade bate à porta e precisamos encarar nossas questões em ordem de amadurecer e sermos plenamente adultos. Pode ser que seja só uma forma da astrologia explicar o processo de amadurecimento que passamos a ter quando vamos nos aproximando dos 30 anos, mas sei lá. De alguma forma, parece que isso fez muito sentido para mim. A realidade veio força nos últimos tempos e talvez isso tenha desencadeado tantos sentimentos de uma só vez em mim.

O que quero dizer com tudo isso é que estou fazendo o possível para me cuidar. Tomando os remédios, que antes tanto abominava e agora me sinto verdadeiramente bem, conseguindo ter ânimo de fazer as coisas, saindo, vivendo mais. Obviamente há dias em que tudo vai pela janela e me pego na cama, sem querer fazer nada, mas finalmente entendi ser um processo. A vida não é preto no branco, as nuances cinzentas fazem parte e ainda bem.

Tenho tentado manter um olhar mais otimista, ou, ao menos, menos desesperado sobre as coisas. Está tudo bem e, se não estiver, logo ficará. Não tenho controle sobre nada além de mim mesma e que bom por isso. Durante anos, me negligenciei para tentar controlar tudo e todos ao meu redor, só para acabar me desgastando e sem sucesso. Fico feliz de ter entendido isso ultimamente.

Os altos e baixos existem, sempre existirão e, mesmo que isso me cause um enorme desconforto, estou mais disposta a encarar as coisas, conseguindo aceitá-las melhor. “No final, a vida é um ato de desapego”, como bem disse Pi¹. Esse desapego não diz respeito só a pessoas e materialidade, mas também a crenças. Estamos em constante mudança, buscando evoluir. Tropeçando, errado, afinal é o que nos torna humanos, mas nos reerguendo e seguindo, porque a vida é sobre se reinventar e levantar sempre que cair. E assim seguimos.


¹ As Aventuras de Pi (2012), dir. Ang Lee